Morreu Mario Vargas Llosa, o último gigante da literatura latino-americana

Morreu Mario Vargas Llosa, o último gigante da literatura latino-americana

O escritor Mario Vargas Llosa, Prémio Nobel da Literatura em 2010, morreu este domingo, aos 89 anos. A notícia foi dada pelos filhos nas redes sociais que divulgaram que ele faleceu na sua casa em Lima, no Perú, “rodeado pela sua família e em paz”.
Mario Vargas Llosa, Prémio Nobel da Literatura em 2010, é considerado como o último gigante de uma geração dourada, um dos protagonistas do “boom” literário latino-americano dos anos 60 e 70, ao lado do colombiano Gabriel Garcia Marquez e do argentino Julio Cortazar.

A notícia da sua morte, aos 89 anos, foi dada pelos filhos na rede social X, que sublinharam que o pai faleceu “rodeado pela sua família e em paz”. Morgana Vargas Llosa escreveu: “A sua partida entristecerá os seus familiares, os seus amigos e os seus leitores em todo o mundo, mas esperamos que encontrem consolo, como nós, no facto de ter tido uma vida longa, múltipla e frutífera, e de deixar atrás de si uma obra que lhe sobreviverá”. A filha acrescenta que, nas próximas horas e dias, as cerimónias fúnebres serão realizadas "de acordo com as suas instruções", pelo que "não haverá cerimónia pública".

O governo do Perú decretou este 14 de Abril como "dia de luto nacional", em que as bandeiras ficam em meia-haste nos edifícios públicos.

Vários actuais e antigos chefes de Estado da América Latina manifestaram o seu pesar na rede social X. A Presidente peruana Dina Boluarte descreveu Mario Vargas Llosa como um "escritor universal e distinto vencedor do Prémio Nobel da Literatura”, cujo “génio intelectual e vasto conjunto de obras permanecerão como um legado eterno para as gerações futuras".

O Presidente da Guatemala, Bernardo Arévalo, descreveu-o como “grande cronista da América hispânica e intérprete perspicaz dos seus caminhos e dos seus destinos”.

O ex-Presidente uruguaio Luis Lacalle Pou declarou que "Vargas Llosa deixou a sua marca em muitos aspectos da vida, mantendo-se sempre fiel a si próprio" e disse que sempre gostou da generosidade de Vargas Llosa.

Os antigos Presidentes colombianos Álvaro Uribe e Iván Duque também se despediram do escritor que chamaram de "mestre".

A líder da oposição venezuelana, María Corina Machado, sublinhou o seu "legado incomparável" na defesa da liberdade na América Latina e no mundo.

O primeiro-ministro espanhol, Pedro Sanchez, também o descreveu, no X, como “mestre universal da palavra”.

Romancista, contista, dramaturgo, argumentista, ensaísta, crítico literário, jornalista, professor universitário e político, Mario Vargas Llosa nasceu em Arequipa, no sul do Perú, a 28 de Março de 1936. Em “Como Peixe na Água”, um livro de memórias publicado em 1993, ele conta que foi o desprezo do pai pela literatura que o fez lutar para ser escritor. Quando soube que Mario escrevia poemas, o pai internou-o num colégio militar, cuja cultura autoritária transparece no seu primeiro romance “A Cidade e os Cães”, publicado em 1963.

Quando tinha 19 anos e frequentava Letras e Direito na Universidade de San Marcos, o escritor casou com uma mulher dez anos mais velha, irmã de uma tia por afinidade e que foi a fonte de “A Tia Júlia e o Escrevedor”, romance de 1977. Concluída a licenciatura, foi para Paris no final da década de 50. Mais tarde, faz um doutoramento na Universidade Complutense de Madrid, que concluirá em 1971 com uma dissertação sobre Gabriel García Márquez e uma reflexão sobre a literatura e a narrativa de ficção que continuará em outros ensaios – “Historia Secreta de una Novela” (1971) e “Cartas a um Jovem Romancista” (1997).

Separa-se de Julia Urquidi Illanes, a “tia Julia”, e, em 1965, casa-se com Patricia Llosa, prima direita e sobrinha da primeira mulher, com quem fica meio século e tem dois filhos e uma filha. Ainda nos anos 60 publica “Conversa na Catedral” (1969), um romance político, baseado nos “anos sombrios” da ditadura de Manuel Apolinario Odría (1948-1956). Outro romance político é “A Festa do Chibo" (2000). Desde cedo, Vargas Llosa começou a envolver-se politicamente, primeiro como apoiante de Fidel Castro e da revolução cubana, depois como defensor da democracia liberal, mais conservadora, capitalista, chegando mesmo a concorrer à presidência do Peru, em 1990, por uma coligação de centro-direita, contra Alberto Fujimori. Vence na primeira volta, mas perde na segunda e regressa à Europa, onde adquire três anos depois a nacionalidade espanhola. Regressou a Lima em 2024.

Em 2010, recebe o Prémio Nobel da Literatura e o júri justifica a escolha de Vargas Llosa por ser detentor de uma escrita que faz a "cartografia das estruturas do poder" e de uma obra que revela "imagens mordazes da resistência, revolta e dos fracassos do indivíduo".
No seu discurso na cerimónia do Nobel, declarou: “Seríamos piores do que somos sem os bons livros que lemos, seríamos mais conformistas, menos inquietos e insubmissos, e o espírito crítico, motor do progresso, nem sequer existiria. Tal como escrever, ler é protestar contra as insuficiências da vida. Quem busca na ficção o que não tem, diz - sem necessidade de o dizer, nem sequer de o saber - que a vida tal como é não nos basta para colmatar a nossa sede de absoluto, fundamento da condição humana, e que deveria ser melhor. Inventamos as ficções para podermos viver, de alguma maneira, as muitas vidas que gostaríamos de ter quando apenas temos uma. Sem as ficções seríamos menos conscientes da importância da liberdade para que a vida seja vivível e do inferno em que se converte quando é espezinhada por um tirano, uma ideologia ou uma religião."

Outras obras-primas do escritor são “Pantaleão e as Visitadoras” (1973), “Quem Matou Palomino Molero?” (1986), “Elogio da Madrasta” (1988) e Os Cadernos de Dom Rigoberto” (1997). Os seus livros estão traduzidos em cerca de 30 línguas.

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